Up

Mas que aventura...

Comecemos por isto: fui com as expectativas no máximo! E não tanto à espera de algo assim. Os últimos dois filmes da Pixar elevaram a fasquia num nível altíssimo e tinham histórias homogéneas no que toca à fronteira entre o que atrai os adultos e o que fascina as crianças. Em Up, é clara a linha que separa as duas principais linhas narrativas do filme: a comovente e belíssima história de Carl Fredricksen (excelente personagem, ao nível de Remy ou Wall-E), o velhote que ambiciona cumprir o desejo da sua falecida mulher, e a mirabolante cruzada por Kevin, a ave rara que o explorador Charles Muntz desesperadamente procura.

Nos primeiros minutos do filme somos transportados pela vida do casal Carl e Ellie numa excepcional e poética montagem de quatro minutos, que, sem quaisquer diálogos ou efeitos sonoros, nos faz sentir mais envolvidos e ligados com aquele casal apaixonado do que em filmes inteiros de romance, tanto graças aos que vemos como à música de Giacchino (é fantástico como com uma simples imagem nos apercebemos da infertilidade de Ellie). Frustrado com a sua vida sem Ellie e com o progresso à sua volta, Carl decide partir na sua casa rumo a Paradise Falls, culpado por não ter satisfeito o mais antigo desejo da falecida esposa. Acidentalmente, Carl ganha a companhia de Russel, um escuteiro trapalhão que transforma esta aventura numa verdadeira história de avós e netos, tal como é habitual nos filmes da Pixar [a temática da família]. Todas estas peripécias e transtornos inerentes à vida real e ao nosso mundo poderiam ter sido mais bem aproveitados, mas o filme acaba por enveredar numa aventura bem mais complicada, envolvendo cães falantes, aves exóticas e um explorador sem escrúpulos. E é aí que Up tem o seu defeito: é demasiado ambicioso e acaba por ficar num desequilíbrio sem sabermos bem que tipo de filme quer ser, talvez pela necessidade de agradar aos mais novos. Embora nada disto nos aborreça, ficamos com a sensação de que Up podia ter sido abordado de uma forma mais séria, já que a vontade de Carl e o seu amor para com Ellie (que acaba por se personificar na casa) resultariam perfeitamente num filme deveras sentimental e mais direccionado ao público adulto.

O possível descontentamento com o desvio da história de Carl e da sua casa, para destaque da perseguição de Kevin, é facilmente esquecido pela fantástica aventura cheia de entusiasmo e emoção, como só sentimos em filmes como Raiders Of The Lost Ark, que Up nos proporciona. Enquanto que preferia a concentração total na comovente e penetrante cruzada de Carl, não deixo de pensar que o filme deslumbrou na abordagem aventureira e divertida muito bem conseguida, tornando-o provavelmente no filme mais "funny" da Pixar. Tudo isto com um estilo muito clássico, que claramente define Up, ao oposto do futurismo de Wall-E.

Michael Giacchino, que já tinha dado provas de mestria em The Incredibles e Ratatouille, cria um tema musical fantástico que acompanha na perfeição o espírito aventureiro e a tal classicidade dos filmes de Hollywood, embora talvez usado excessivamente. Quanto à imagem, pfuuu... O que é que há para dizer? A Pixar deslumbra novamente com a tecnologia que sabe utilizar como ninguém, principalmente com a oportunidade que tiveram de retratar paisagens fabulosas e lugares exóticos, em que o 3D se fez notar na percepção de profundidade, apesar de limitar um pouco as cores e o ecrã de filme (o melhor é mesmo ver a versão original, que não está disponível em 3-D). As texturas, cores, criaturas, paisagens e tudo o resto estão deslumbrantes e cada vez mais perfeitas. Pete Docter cumpre com distinção o seu segundo trabalho como realizador (Monsters Inc. em 2001). A Pixar sabe mesmo o que está a fazer. Up é Altamente!
0 Responses